2023 pode ser o ano de alteração de paradigma, em que de uma matriz de inovação tecnológica, assente em concentração de mercado, das Big Tech, se inicie a construção de uma nova realidade, que bem poderíamos chamar da próxima onda de inovação, a 7ª, a das Small Tech.
Nos últimos 250 anos, testemunhamos várias ondas de inovação , desde a Revolução Industrial até à das tecnologias verdes. Atualmente, estamos na 6ª onda, a mais curta de todas; inteligência artificial, robôs e DLT (Distributed ledger technology).
2022 pode vir a ser o ano em que os historiadores declararão a morte da Big Tech. Se assim for, 2023, pode muito bem ser o ano do nascimento da Small Tech , onde inovação, agilidade e criação de valor, todas as características que permitiram que a Big Tech se tornasse grande, voltam a fazer-se, a partir de uma economia mais local, num ambiente aberto e competitivo, com novos e fragmentados atores.
Avizinha-se uma onda de choque, típica da passagem de uma matriz para outra, se quiserem, de uma 6ª onda para uma 7ª. A Apple, a Google e a Microsoft, as avós da Big Tech, tornaram-se tão bem-sucedidas, mudando o mundo pela forma como resolviam necessidades de mercado e na forma como se apresentaram, em contrapartida, às propostas da sua concorrência, assentes em modelos mais conservadores. Isto deu-lhes vantagens que essa sua concorrência negligenciou e foi o mote para o sucesso do crescimento da matriz a que assistimos, nessa vaga de inovação das Big Tech.
Juntaram-se-lhes a Amazon, a AliExpress, FTX, as concentrações tornaram-se parte do dia a dia, seguindo a mesma estratégia, a agregação das operações, assentes em tecnologia e as vantagens que esta permitia, face às ofertas concorrentes. Aos poucos, à medida que este tipo de novos atores, se posicionavam no mercado, a política de combate da concorrência, iniciou uma mudança de paradigma que abandonou a inovação como pilar, dentro da sua matriz, para seguir uma política de aquisição de “tudo o que se mexe”, ou seja, toda a inovação que se apresentasse como potencial concorrência no mercado, era adquirida. Isto, levou-nos à extinção do modelo de “garagens” como centros de disrupção, onde se tinham originado, ondas de criação e inovação verdadeiramente transformadoras, para um modelo de “máquinas de capital” num processo insano, para o bom funcionamento dos mercados, onde “tudo o que mexe, é nosso ou morre”.
Como em situações homólogas, no passado, na transformação que a tecnologia teve sobre a produção em massa de muitas indústrias, para uma matriz de produção em nichos, habilmente explorada no livro “Long tail” (cauda longa) escrito por Chris Anderson, assistimos mais do que provavelmente, ao fim de um ciclo de concentração de mercado, para um mercado fragmentado em propostas mais adequadas a cada nicho de necessidades, sejam elas de que tipologia forem; sociais, culturais, politicas, financeiras, ecológicas, industriais, comerciais ou serviços.
Os sinais são evidentes, a Meta apresentou, uma queda nos lucros, pela primeira vez desde a sua fundação. Nestes movimentos de desaceleração e alteração, mais de 100.000 trabalhadores foram demitidos e os números não param de crescer. Elon Musk no processo de aquisição do Twitter, é apenas, mais um surpreendido, por um fenómeno que tem ocorrido de forma natural, ao longo dos últimos dois séculos e meio. Uma vez mais, o gênio saiu da lamparina, está a dissolver uma matriz e a criar uma nova, num movimento, de uma indústria representada nas Big Tech, para uma nova realidade tecnológica que responda às atuais necessidades globais.
Há quem defenda que as Big Tech nunca deveriam ter ficado tão grandes. É compreensível, pois o valor de mercado das cinco maiores empresas de tecnologia é maior do que as economias de várias nações de médio porte. Mas o verdadeiro problema não é o seu tamanho, o problema real é, como as grandes empresas de tecnologia, usam esse seu tamanho e poder. De tal importância tem sido essa sua influência que são notórios os efeitos que elas exercem, refletindo-se, em tantos exemplos conhecidos, nas economias, e até, nos próprios processos de escrutínio das democracias.
Os melhores engenheiros e programadores de software do mundo provavelmente estão a observar as demissões em massa em andamento e a perceber que a segurança no emprego e os rendimentos não são garantidos pelas grandes empresas de tecnologia. Alguns de nós podemos até perguntar-nos: Como chegamos até aqui? Como deixaram que essas empresas comprassem tantos concorrentes menores e impedissem assim, o surgimento de nova concorrência, controlando, tanto os talentos, como as oportunidades nos seus segmentos de mercado. Não será isso ilegal, sob o ponto de vista das leis da livre concorrência. Quais os responsáveis por tal cenário: Os reguladores, os políticos, ou ambos?
Agora parece-me que essas empresas já não precisam de ser divididas pelos reguladores, pois já estão a ser reguladas pela disrupção assertiva do próprio mercado. Talvez tivesse de ser assim. Talvez não se possa fazer um ajustamento tão profundo sem que tenhamos de assistir a uma onde de choque desta magnitude.
Um pequeno número desses trabalhadores demitidos tornar-se-á no combustível empresarial para a próxima onda de inovação em tecnologia, algo que é desesperadamente necessário. Precisamos de tanta competição quanto possível para maximizar esta onda. Precisamos de tanto talento a resolver tantos problemas quanto possível, com as; alterações climáticas, controlo de doenças, segurança alimentar, educação, bem-estar, e em última análise, o futuro da própria paz e estabilidade mundial, dependem de uma onda de inovação tecnológica, nunca vista. Esta não se poderia fazer às costas do mantra fracassado das Big Tech, de “Tudo o que mexe, é nosso ou morre”.
Quem está no timão deste setor, sabe há muito, que isso era inevitável acontecer, agora começa a ficar claro também para quem está fora dele. Dos mais de 1.500 trabalhadores de tecnologia inqueridos num estudo de 2021, pela Protocol*, onde; quase 80% disseram que as grandes empresas de tecnologia têm demasiado poder. Cerca de 40% desses trabalhadores, acreditam que a tecnologia faz mais mal do que bem, e um número igual, disse que grandes empresas de tecnologia como; o Facebook, a Amazon, a Alphabet e a Apple deveriam ser desmembradas.
* www.protocol.com/policy/tech-employee-survey/tech-employee-survey-2021
Neste novo mundo, já não haverá lugar para um próximo Steve Jobs ou Bill Gates, esta nova realidade, far-se-á de inúmeros Steves e Gates, dos muitos que hoje estão presos a supostas gaiolas douradas, numa qualquer dessas moribundas Big Tech, a receber um salário de seis dígitos apenas para não sair e se tornar um concorrente. Espero, pelo bem de todos nós e da economia que eles façam parte da atual onda de demissões. No final, feitas contas, as Big Tech decepcionaram os seus usuários, muitos dos seus investidores, alienaram reguladores e formuladores de políticas. As Small Tech podem fornecer o crescimento sustentado que os investidores ambicionam, a concorrência que os reguladores desejam, os benefícios que os usuários precisam, e uma distribuição de valor, livre dos efeitos perniciosos que a concentração, característica das Big Tech, tornou realidade.
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