Há um axioma que ecoa como um murmúrio através dos corredores da história, da filosofia e do saber em geral: "Quem diz que sabe, não sabe, pois quem sabe não diz saber".
Neste paradoxo repousa não apenas uma crítica à presunção de conhecimento, mas também uma indicação sutil sobre a natureza enigmática da sabedoria e da auto compreensão. A frase convoca-nos para uma viagem epistemológica que atravessa o tempo e o espaço, do antigo Oriente ao pensamento Ocidental, e que hoje encontra ressonância nos mais sofisticados debates da teoria do conhecimento.
É inevitável começar essa análise remontando a Sócrates e ao seu famoso dito: "Só sei que nada sei". Trata-se de uma frase que é, por si só, uma confissão e uma acusação. Confissão de humildade perante o abismo infinito do desconhecido, e uma acusação contra aqueles que, embriagados pelo conhecimento superficial ou fragmentado, reivindicam para si a coroa da sabedoria. A complexidade do mundo, segundo Sócrates, é tal que qualquer tentativa de o aprisionar em definições estanques ou em conceções totalizantes é vã, e, acima de tudo, falaciosa.
Ir além de Sócrates, mergulha-nos na complexa trama da epistemologia contemporânea, onde a certeza foi substituída pela probabilidade e o conhecimento absoluto cedeu lugar ao conhecimento contingente. Os filósofos da ciência, como Karl Popper e Thomas Kuhn, têm-nos mostrado que mesmo as teorias científicas mais robustas são provisórias, sujeitas a serem derrubadas por uma única observação incongruente. A "falsificabilidade", segundo Popper, é o critério que separa a ciência da não-ciência; no entanto, a falsificabilidade também significa que nenhum conhecimento é definitivo.
Este axioma também nos convoca a ponderar sobre a crescente especialização do saber. À medida que nos aprofundamos num determinado campo de estudo, torna-se cada vez mais claro quão vasto e inexplorado é o terreno que ainda nos rodeia. A consequência inevitável deste processo é uma humildade intelectual, que poderá parecer paradoxal à luz do conhecimento especializado que se adquire. "Quem diz que sabe, não sabe, pois quem sabe não diz saber" pode ser lido como um alerta contra o perigo da miopia intelectual, que frequentemente acompanha a expertise e por vezes, ou na maioria das vezes, a “espertice”.
Mas o que dizer daqueles que realmente atingiram patamares elevados de compreensão e sabedoria? Não terão eles o direito de proclamar o seu saber? A resposta a esta questão talvez resida na distinção entre "saber" e "sabedoria". O saber é acumulativo, mensurável, exibível. A sabedoria, por outro lado, é introspetiva, silenciosa e, frequentemente, indizível. Quem é verdadeiramente sábio compreende não só a extensão do seu próprio conhecimento, mas também as suas limitações, e é esta compreensão que o torna relutante em proclamar-se sábio.
Este axioma oferece-nos uma via para a emancipação do dogmatismo e da arrogância intelectual. Ele ensina e alerta-nos para o fato, da busca pelo conhecimento ser uma jornada sem fim, e que cada resposta encontrada gera novas perguntas, num ciclo infinito de curiosidade e descoberta. Quem entende isso não apenas sabe, mas é sábio. Paradoxalmente, é esta sabedoria que o torna consciente de que nunca saberá o suficiente para dizer que sabe.
“Só sei que nada sei” é o mesmo que dizer: quem diz que sabe, não sabe, pois quem vive para o saber, não o diz.”
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