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No milagre do Natal, um desejo de Novo Ano

Ao contemplar as multifacetadas culturas humanas, somos arrebatados por uma constatação espantosa: a paradoxal e surpreendente similaridade inerente à nossa raça, mesmo quando tudo fazemos para criar as condições contrárias.

  • Opinião
  • Publicado: 2023-12-23 16:39
  • Por: Antero Carvalho

Surge, então, uma indagação: existirá um elemento unificador, tão poderoso que, apesar da heterogeneidade cultural, se oculta profundamente, quase etéreo e imutável, mas essencial para manter a raça una.

À medida que a capacidade de questionar da humanidade evoluiu, essa mesma evolução, gerou uma consequente e necessária complexidade de respostas, à qual, a acídia com que vivemos impregnados, não nos permitiu que respondêssemos, a essa necessidade, com a rapidez, com que, dúvidas e temores nascem e crescem.

Tal constatação torna-se evidente ao examinarmos os rituais religiosos, universais em todas as culturas, pela sua capacidade de apaziguar os conflitos nas profundezas da psique humana. Noutras palavras, são as religiões e a fé nelas, que fornecem um abrigo para a maioria das inquietações humanas, respondendo aos temores nascidos das limitações inerentes à nossa procura por respostas. 

Apesar de frequentemente dividida por disputas, guerras e acordos de paz frágeis, que invariavelmente semeiam futuros conflitos, são estes elementos invisíveis que, inconscientemente, forçam a humanidade a manter uma proximidade relativa, evitando um abismo intransponível.

Em termos mais abstratos, parece existir uma força divina que nos atrai uns aos outros, falando-nos numa linguagem impercetível, mas que sabemos estar presente, repreendendo-nos sempre que nos tentamos afastar demasiado, afastamento esse, que poderia levar a uma rutura irreparável.

Esses elementos comuns a todas as culturas, presentes na origem de qualquer fenômeno ritualístico e mantendo uma certa coerência entre elas, podem ser denominados simplesmente como: medo e esperança. Foi o medo do desconhecido pós-morte que levou o homem a inventar religiões, através das quais criou mensageiros e mensagens de esperança e fórmulas para a salvação, inventando a fé.

Assim, é graças a esse medo profundo, universal a todos os seres humanos e superior a qualquer poder individual, a quem devemos, de fato; a paz, humildade e humanidade relativas, aquelas que conseguimos alcançar. A humanidade foge do medo, correndo incessantemente para os braços da fé que nos alimenta com a esperança. Neste movimento constante, a força divina que nos governa, congela momentaneamente, os seres animalescos que somos, em algo que nos mantém condicionalmente próximo da Sua própria imagem, esperando que algum dia possamos ganhar a nossa emancipação.

À medida que esta temporada festiva avança para o seu fim, e um novo ano se avizinha, ao observarmos os fogos de artifício a iluminar o céu, convido-vos ao exercício de reflexão, sobre este estado de infância e dependência que a humanidade ainda vive, levando a que o divino, até hoje, ainda mantenha vivos em nós, esses sentimentos comuns, para que, apesar das nossas diferenças, existam esses laços invisíveis, ocultos no medo e esperança que entrelaçam a nossa existência, mantendo-nos unidos, numa forçada eterna procura, por significado e redenção.

Seria importante, como desejo comum e individual, para o novo ano, alcançarmos a emancipação como seres humanos, libertando-nos dessa necessidade. No entanto, para tal, precisamos, crescer e amadurecer, para alcançar tal merecimento enquanto raça. E isso, apenas será possível, com o nascimento da chama que incinera a acídia, a arrogância, a prepotência e o egoísmo, em cada um de nós. Isso sim, seria o verdadeiro milagre de Natal.

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